Agosto Dourado

No mês de agosto, a Sociedade Brasileira de Pediatria está desenvolvendo atividades de apoio e estimulo ao aleitamento materno. Trata-se de uma Campanha para mostrar ao Brasil que a “Amamentação vale ouro”.

A cada dia do mês será publicada uma razão para amamentar. Serão, portanto, 31 no total. A Campanha pode ser acompanhada neste link:

Em 2012, a Academia Norte-Americana de Pediatria publicou recomendações reforçando a importância do aleitamento materno exclusivo nos primeiros seis meses de vida e continuação do aleitamento após introdução da alimentação complementar.

Os benefícios são muitos e conhecidos:

– O aleitamento materno reduz a frequência de adoecimentos respiratórios, incluindo infecção de ouvido. Reduz também a incidência de infecções do trato gastrointestinal, causa de vômitos e diarréia.

– Reduz, também, as chances de morte súbita do bebê durante o sono.

– É um fator protetor contra doenças alérgicas, como a asma e contra doenças auto-imunes, como a doença celíaca e o diabetes tipo 1.

– É sabido que bebês amamentados ao seio materno tem menor incidência de obesidade na adolescência e vida adulta.

– Além disso, o leite materno é considerado o melhor alimento para o crescimento e desenvolvimento cerebral dos bebês.

– O aleitamento é capaz de reduzir, inclusive, a ocorrência de alguns tipos de câncer na infância, como leucemia e linfoma.

– Isso sem falar nos benefícios maternos e econômicos associados.

Mas, queria hoje destacar um benefício menos mensurável pelas estatísticas, embora amplamente reconhecido:

“No início do segundo mês [de vida], a aproximação de um ser humano começa a adquirir um lugar especial entre as “coisas” que rodeiam o bebê. Neste estágio, o bebê começa a perceber visualmente a aproximação do adulto.

Se você se aproxima do bebê que chora, faminto, na hora de ser alimentado, ele ficará quieto, abrindo a boca ou fazendo movimentos de sucção. Nenhuma outra “coisa” produzirá tal resposta nessa idade, exceto a percepção intra-oral e tátil do alimento. […]

Duas ou três semanas mais tarde, notamos um outro progresso: quando o bebê percebe um rosto humano segue seus movimentos com atenção concentrada. […] Agora o bebê é capaz de isolá-lo e distinguí-lo do plano de fundo. Investe nele sua atenção completa e prolongada.

No terceiro mês, este “voltar-se para”, em resposta ao estimulo do rosto humano, culmina em uma nova resposta, claramente definida, e específica da espécie. […]

Ele agora responderá ao rosto do adulto com um sorriso.

[…] Este sorriso é a primeira manifestação comportamental, ativa, dirigida e intencional, o primeiro indicador da transição de completa passividade do bebê para o início do comportamento ativo que, de agora em diante, desempenhará um papel cada vez mais importante.

Nesta idade, nada mais, nem mesmo o alimento, provoca essa resposta. […]

Realmente, durante os primeiros meses de vida, o ser humano aparece no campo visual do bebê todas as vezes que uma de suas necessidades é satisfeita. Assim, o rosto humano se torna associado à supressão do desprazer assim como à experiência de prazer. […]

Raramente, estamos conscientes do fato de que em qualquer coisa que estejamos fazendo com o bebê, se o levantamos, lavamos, trocamos as fraldas, etc., sempre oferecemos nosso rosto diretamente à inspeção da criança, fitando-a nos olhos, movendo nossa cabeça e, na maioria das vezes, dizendo alguma coisa.

Isso significa que o rosto, tal como se apresenta, é o estímulo visual mais frequentemente oferecido ao bebê durante os primeiros meses de vida.

No decorrer das primeiras semanas de vida, um traço do rosto humano é estabelecido na memória infantil, como primeiro signo da presença de uma satisfação das necessidades. O bebê acompanhará com os olhos todos os movimentos desse signo.

A partir do início da vida, é a mãe, o parceiro humano do filho, que serve de mediador de toda percepção, toda ação, todo insight, todo conhecimento. […]

Quando os olhos do bebê seguem cada movimento da mãe; quando ele consegue isolar e estabelecer um signo no rosto da mãe, então, através da instrumentalização da mãe, ele isolou uma entidade significativa no caos de “coisas” sem significado do ambiente.

Devido às contínuas trocas afetivas, esta entidade – o rosto da mãe – assumirá para a criança um significado cada vez maior.

[…]

Na maioria dos casos, o bebê que mama olha fixamente para o rosto da mãe, de modo constante, durante o ato da amamentação, sem desviar os olhos, até adormecer no seio. […]

De modo marcante, o peito da mãe, seus dedos, oferecem ao bebê que está amamentando inúmeros estímulos táteis; esses estímulos lhe dão a oportunidade de aprender e praticar a percepção e a orientação;

O bebê experimenta o toque superficial, a sensibilidade profunda e o equilíbrio sobre o corpo da mãe, reagindo aos movimentos dela; e é quase desnecessário acrescentar que é a voz materna que oferece ao bebê estímulos acústicos vitais, que são os pré-requisitos para o desenvolvimento da fala.

[…]

Mais uma vez somos obrigados a voltar às origens e discutir o papel totalmente abrangente da mãe no aparecimento e desenvolvimento da consciência do bebê e a participação vital que ela tem nesse processo de aprendizagem.

Nesse contexto, é inestimável a importância dos sentimentos da mãe em relação a ter um filho, o “seu” filho. Sabe-se que estes sentimentos variam dentro de uma escala muito ampla, mas não se tem muita consciência disso, porque quase todas as mulheres se tornam mães meigas, amorosas e dedicadas.

Criam na relação mãe-filho o que denominamos clima emocional favorável, sob todos os aspectos, ao desenvolvimento da criança. São os sentimentos maternos em relação ao filho que criam esse clima emocional.

O amor e afeição pelo filho o tornam um objeto de contínuo interesse para a mãe; e além desse interesse persistente ela lhe oferece uma gama sempre renovada, rica e variada, todo um mundo de experiências vitais.

O que torna essas experiências tão importantes para a criança é o fato de que elas são interligadas, enriquecidas e caracterizadas pelo afeto materno; e a criança responde afetivamente a esse afeto.

Isso é essencial na infância, pois nesta idade os afetos são de importância muitíssimo maior do que em qualquer outro período posterior da vida. No decorrer de seus primeiros meses, a percepção afetiva e os afetos predominam na experiência do bebê, praticamente com exclusão de todos os outros modos de percepção. […]

Portanto, a atitude emocional da mãe, seus afetos, servirão para orientar os afetos do bebê e conferir qualidade de vida à experiência do bebê.”

René A. Spitz, 1965

Concluímos que, além de todas as vantagens nutricionais, imunológicas e epigenéticas conhecidas do leite materno, a amamentação transmite amor e afeto. E talvez esse seja o elemento mais dourado deste mês de agosto.

Fontes:

1. Spitz, R.A. O Primeiro Ano de Vida. Martins Fontes, São Paulo, 1ª Edição, 1996

2. Sociedade Brasileira de Pediatria – Amamentação vale ouro

3. American Academy of Pediatrics. Breastfeeding and the Use of Human Milk. Pediatrics, 2012

#SMAM2017

André Botinha

André Botinha

Pediatra especializado nos primeiros 1000 dias de vida, incluindo a gestação e os 2 primeiros anos.

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